Uma revisão da divisa entre o Paraná e Santa Catarina ocorrida recentemente atraiu a atenção da imprensa nacional. Com a mudança, os paranaenses perdem 490 hectares de seu território.
Na prática, a alteração na linha que divide Guaratuba (PR) e Garuva (SC) é praticamente irrisória, uma vez que corresponde a 0,002% da extensão territorial do Paraná. No entanto, outros trechos da divisa de 754 km entre os dois estados podem passar por um pente-fino após o erro encontrado por um morador do litoral.
A atual divisa entre os dois estados foi definida após longas disputas territoriais, que tiveram início ainda no período colonial e se estenderam até o século XX. As tensões culminaram na Guerra do Contestado (1912-1916), conflito armado entre sertanejos e forças do governo brasileiro.
A resolução definitiva ocorreu em 20 de outubro de 1916, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil tomou uma decisão final sobre a disputa parecia como a que ocorre atualmente entre Piauí e Ceará, no Nordeste. O STF determinou que a linha que define os limites entre os estados deve seguir a linha geodésica que une a foz do Rio Saí-Guaçu, no litoral, ao marco da nascente do Rio Santo Cristo, na divisa com a Argentina, como mostram os mapas históricos do Paraná.

Com o tratado assinado pelo presidente Wenceslau Braz, coube ao Exército Brasileiro fazer a demarcação da nova linha divisória. A instalação dos marcos geodésicos foi feita com a tecnologia da época, tempos em que a cartografia não contava com recursos como satélite ou GPS.
Litígios com SP e MS
Além da revisão da divisa com Santa Catarina, o Paraná tem ao menos duas questões em litígio, uma com São Paulo e outra com o Mato Grosso do Sul. Na questão com os paulistas, a disputa ocorre no litoral, território da Serra Negra, em uma área de 294 quilômetros quadrados entre Guaraqueçaba (PR) e Barra do Turvo (SP). A lei que determina a divisa tem como referência as “águas vertentes” locais. A imprecisão do texto gera dúvida se a expressão leva em conta apenas o córrego em questão ou a toda bacia hidrográfica. Atualmente, a área maior que a de 246 municípios paranaenses, é reconhecida como território paulista.

A outra disputa, com Mato Grosso do Sul, compreende quatro ilhas no Rio Paraná. Duas delas, as ilhas Japonesa (10,53 km2) e Floresta (28,04 km2) ficam próximas a Porto Rico (Noroeste). A maior delas, a Ilha dos Bandeirantes, (55,52 km2) liga o distrito de Porto Camargo, em Icaraíma (Noroeste), a Naviraí (MS) pelo complexo de pontes da BR-487. Já a última delas, a Ilha Peruzzi (28,56 km2) fica nas proximidades de Guaíra e Mundo Novo (MS). As quatro ilhas pertencentes ao Parque Nacional de Ilha Grande são reconhecidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como territórios sul-mato-grossenses.
O assunto foi tema de reportagem que escrevi para a Folha de Londrina, em 2016. Em oito anos, não houve avanços nas tratativas para a resolução dos litígios.
Municípios do Paraná
O trabalho de revisão de linhas divisórias não restringem às divisas. No Paraná, quase a metade dos municípios tiveram mudanças em seus limites em 2024. Dos 399 municípios do Estado (42,6%) tiveram ajustes de limites – 76 ganharam território e 94 diminuíram de tamanho. O levantamento foi produzido pelo Instituto Água e Terra do Paraná (IAT) entre maio de 2023 e abril de 2024 por meio da revisão de documentos, leis e materiais cartográficos, além de trabalhos de campo. O IAT é vinculado à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável (Sedest).

Em entrevista ao site do IAT, o engenheiro florestal responsável pela divisão, Amauri Simão Pampuch explica que a maior parte dos ajustes foi pequena, não passando de alguns quilômetros quadrados de área. Apesar disso, reforça ele, a divisão precisa dos limites municipais é algo de essencial para a adoção de políticas públicas e o repasse de recursos por parte do Governo do Estado. “A definição precisa dos limites proporciona segurança jurídica aos gestores municipais na administração do território e melhora também o planejamento e execução de atividades nas áreas ambiental, social e econômica”, destaca.
Uma das ações do Governo do Estado diretamente impactadas por esses ajustes de áreas é o ICMS Ecológico por Biodiversidade, programa paranaense que faz o repasse de recursos financeiros para municípios que possuam Áreas Protegidas. As alterações no território das cidades podem afetar o valor pago aos municípios, como explica a gerente de Biodiversidade do IAT, Patricia Accioly Calderari da Rosa.
“A demarcação dos limites municipais é uma variável bem importante, já que a relação entre a área do município e o tamanho da área protegida é um dos parâmetros de cálculo do ICMS Ecológico por Biodiversidade. Se um município possui um território muito grande e pequenas áreas protegidas, por exemplo, terá um impacto no cálculo que reduzirá o fator ambiental, e vice-versa”, afirma Patrícia.
Confira quem ganhou e quem perdeu território:
Redução de área
Abatiá, Adrianópolis, Agudos do Sul, Andirá, Antônio Olinto, Araruna, Araucária, Barra do Jacaré, Campina Grande do Sul, Campo Magro, Candói, Cantagalo, Carambeí, Catanduvas, Cerro Azul, Céu Azul, Clevelândia, Congonhinhas, Conselheiro Mairinck, Contenda, Cruz Machado, Cruzeiro do Oeste, Curitiba, Curiúva, Diamante D’Oeste, Dois Vizinhos, Doutor Ulysses, Fernandes Pinheiro, Floresta, Foz do Iguaçu, Francisco Beltrão, General Carneiro, Goioerê, Guapirama, Guaraqueçaba, Guaratuba, Ibema, Icaraíma, Imbaú, Imbituva, Ipiranga, Irati, Itapejara D’Oeste, Itaúna do Sul, Jaboti, Jaguariaíva, Jandaia do Sul, Janiópolis, Joaquim Távora, Jundiaí do Sul, Lapa, Mallet, Mandaguaçu, Mandirituba, Mirador, Nova Esperança do Sudoeste, Nova Laranjeiras, Nova Tebas, Ortigueira, Paranacity, Paula Freitas, Pérola d’Oeste, Pinhalão, Pinhão, Piraquara, Pontal do Paraná, Porto Amazonas, Porto Vitória, Prudentópolis, Quatiguá, Quatro Barras, Ramilândia, Ribeirão do Pinhal, Rio Azul, Rio Branco do Ivaí, Rio Branco do Sul, Rosário do Ivaí, Santa Helena, Santo Antônio da Platina, São João, São Jorge do Ivaí, São José da Boa Vista, São José dos Pinhais, Siqueira Campos, Teixeira Soares, Telêmaco Borba, Tijucas do Sul, Tuneira do Oeste, Umuarama, União da Vitória, Vitorino e Wenceslau Braz.
Aumento de área
Almirante Tamandaré, Antonina, Arapoti, Balsa Nova, Bocaiúva do Sul, Bom Jesus do Sul, Bom Sucesso, Cambará, Campo Bonito, Campo do Tenente, Campo Largo, Capanema, Carlópolis, Cascavel, Castro, Chopinzinho, Colombo, Coronel Domingos Soares, Cruzeiro do Sul, Diamante do Norte, Enéas Marques, Fazenda Rio Grande, Figueira, Grandes Rios, Guamiranga, Guaraniaçu, Guarapuava, Ibaiti, Inácio Martins, Itaipulândia, Itaperuçu, Ivaí, Ivatuba, Jacarezinho, Japira, Matelândia, Matinhos, Medianeira, Missal, Morretes, Nova Olímpia, Palmeira, Paranaguá, Paranavaí, Paulo Frontin, Peabiru, Piên, Pinhais, Piraí do Sul, Pitanga, Planalto, Ponta Grossa, Presidente Castelo Branco, Querência do Norte, Quitandinha, Rancho Alegre D’Oeste, Rebouças, Reserva, Ribeirão Claro, Rio Negro, Salto do Itararé, Santa Terezinha de Itaipu, Santana do Itararé, São João do Triunfo, São Mateus do Sul, São Miguel do Iguaçu, Sapopema, Sengés, Tapejara, Terra Rica, Tibagi, Tomazina, Tunas do Paraná, Ventania, Verê e Xambrê.